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A Illustre Casa de Ramires

A Illustre Casa de Ramires

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Chapter 1 No.1

Word Count: 6042    |    Released on: 06/12/2017

re a camisa de chita c?r de rosa, trabalhava. Gon?alo Mendes Ramires (que n'aquella sua velha aldêa de Santa Ireneia, e na villa visinha, a aceada

toria, Revista nova, fundada por José Lucio Castanheiro, seu antigo cama

mesa-mesa immensa de pés torneados, coberta com uma colcha desbotada de damasco vermelho, e atravancada n'essa tarde pelos rijos volumes da Historia Genealogica, todo o Vocabulario de Bluteau, tomos soltos do Panorama, e ao canto, em pilha, as obras de Walter Scott sustentando um copo cheio de cravos amarellos. E d'ahi, da sua cadeira de couro, Gon?alo Mendes Ramires, pensativo deante das tiras de papel alma?o, ro?ando pela testa

l e sempre pura, até aos vagos Senhores que entre Douro e Minho mantinham castello e terra murada quando os bar?es francos desceram, com pend?o e caldeira, na hoste do Borguinh?o. E os Ramires entroncavam limpidamente a sua casa, p

adaver do velho, trespassado por quatro virotes, estirado no pateo da Alca?ova ao lado do corpo do Conde de Marialva-Affonso V arma juntamente cavalleiros o Principe seu filho e Fern?o Ramires, murmurando entre lagrimas: ?Deus vos queira t?o bons como esses que ahi jazem!...? Mas eis que Portugal se faz aos mares! E raras s?o ent?o as armadas e os combates de Oriente em que se n?o esforce um Ramires-ficando na lenda tragico-maritima aquelle nobre capit?o do Golpho Persico, Balthazar Ramires, que, no naufragio da Santa Barbara, reveste a sua pesada armadura, e no castello de pr?a, hirto, se afunda em silencio com a náu que se afunda, encostado á sua grande espada. Em Alcacer-Kebir, onde dous Ramires sempre ao lado d'El-Rei encontram morte soberba, o mais novo, Paulo Ramires, pagem do Gui?o, nem lezo nem ferido, mas n?o querendo mais vida pois que El-Rei n?o vivia, colhe um ginete solto, apanha uma acha d'armas, e gritando:-?Vai-te, alma, que já tardas, servir a de teu senhor!?-entra na chusma mourisca e para sempre desapparece. Sob os Philippes, os Ramires, amuados, bebem e ca?am nas suas terras. Reapparecendo com os Bragan?as, um Ramires, Vicente, Governador das Armas d'Entre-Douro e Minho por D. Jo?o IV, mette a Castella, destro?a os Hespanhoes do Conde, de Venavente, e toma Fuente-Gui?al, a cujo furioso saque preside da varanda d'um Convento de Franciscanos, em mangas de camisa, comendo talhadas de melancia. Já, porém, como a na??o, degenera a nobre ra?a... Alvaro Ramires, valido de D. Pedro II, brig?o fa?anhudo, atord?a Lisboa com arrua?as, furta a mulher d'um Védor da Fazenda que mandára matar a pauladas por pretos, incendeia em Sevilha depoi

astanheiro, os tres que se occupavam das cousas do saber e da intelligencia (porque dos tres restantes um era homem de cacete e for?as, o outro guitarrista, e o outro ?premiado?), passaram, aquecidos por aquella chamma patriotica, a esquadrinhar na Bibliotheca, nos grossos tomos nunca d'antes visitados de Fernam Lopes, de Ruy de Pina, d'Azurara, proezas e lendas-?só portuguezas, só nossas (como supplicava o Castanheiro), que refizessem á na??o abatida uma consciencia da sua heroicidade!? Assim crescia o Cenaculo Patriotico da casa das Severinas. E foi ent?o que Gon?alo Mendes Ramires, mo?o muito affavel, esvelto e loiro, d'uma brancura s? de porcelana, com uns finos e risonhos olhos que facilmente se enterneciam, sempre elegante e apurado na batina e no verniz dos sapatos-apresentou ao Castanheiro, n'um domingo depois do almo?o, onze tiras de papel intituladas D. Guiomar. N'ellas se contava a velhissima historia da castell?, que, emquanto longe nas guerras do Ultra-mar o castell?o barbudo e cingido de ferro atira a acha-d'armas ás portas de Jerusalem, recebe ella na sua camara, com os bra?os nús, por noite de Maio e de lua, o pagem de annellados cabellos... Depois ruge o inverno, o castell?o volta, mais barbudo, com um bord?o de romeiro. Pelo villico do Castello

!... A Guiomar, realmente, é uma castell? vaga, da Bretanha ou da Aquitania. Mas no villico, mesmo no castell?o, já transparecem portuguezes, bons portuguezes de fibra e d'alma, d'entre

es, como ?o nosso Walter Scott!? Elle, de resto, annunciára já com simplicidade um Romance em dois volumes, fundado nos annaes da sua Casa, n'um rude feito de sublime orgulho de Tructesindo Mendes Ramires, o amigo e Alferes-mór de D. Sancho I. Por temperamento, por aquelle saber especial de trajes e alfaias que

s enredos da C?rte, proclamavam a necessidade d'uma ?Orienta??o positiva? e d'um ?largo fomento rural?, consideravam como leviandade reles e jacobina a irreverencia da Academia pelos Dogmas, e, mesmo passeando ao luar no Choupal ou no Penedo da Saudade, discorriam com ardor sobre os dous Chefes de Partido-o Braz Victorino, o homem novo dos Regeneradores, e o velho Bar?o de S. Fulgencio, chefe classico dos Historicos. Inclinado para os Regeneradores, por que a Regenera??o lhe representava tradicionalmente idéas de conservantismo, de elegancia culta e de generosidade, Gon?alo frequentou ent?o o Centro Regenerador da Coura?a, onde aconselhava á noite, tomando chá preto, ?o fortalecimento da auctoridade da Cor?a?, e ?uma forte expans?o colonial!? Depois, logo na Primavera, desmanchou alegremente esta gravidade politica: e ainda tresnoitou, na taberna do Camolino, em bacalhoadas festivas,

, viveu na casa do Cavalleiro, na rua de S. Jo?o... Pois n?o ha uma amizade tradicional, quasi historica, entre Ramires e Cavalleiros?..

eneia: que entre as duas terras corria muito justificadamente a ribeira do Coice: e que o Sr. André Cavalleiro, e

nhor, b

ta Clara, esbarrou no Rocio com José Lucio Castanheiro; ent?o empregado no Ministerio da Fazenda, na reparti??o dos Proprios Nacionaes. Mais defecado, mais macilento, com uns oculos mais largos e mais tenebrosos, o Castanheiro ardia todo, como em Coimbra, na chamma da sua Idéa-?a resurrei??o do sentimento portuguez!? E agora, alargando a propor??es condignas da Capital o plano da Patria, labutava devoradoramente na crea??o d'uma Revista quinzenal de setenta paginas, com capa azul, os Annaes de Litteratura e de Historia. E

sou que ainda n?o come

os oculos sobre elle, duros e desconsolados. Ent?o

s do Patriotismo. Nem consentio que Gon?alo, humilhado perante aquella Fé que se mantivera t?o pur

ta! No ver?o chega o Gama á India!... E no ver?o vae o nosso Gon?alo escrever uma novellasinha sublime!... De resto os Annaes só apparecem em Dezembro, caracteristicamente no Primeiro de Dezembro. E você em tres mezes resuscita um

o reclamo de Portugal, de modo que todos o conhe?am-ao menos como se conhece o Xarope Peitoral de James, hein? E que todos o adoptem-ao menos como se adoptou o sab?o do Congo, hein? E conhecido, adoptado, que todos o amem emfim, nos seus heróes, nos seus feitos, mesmo nos seus defeitos, em todos os seus padr?es, e até nas veras pedrinhas das suas cal?adas! P

, caramba! Pela consciencia que renova de termos sido t?o grandes sacode este chocho consentimento nosso em permanecermos pequenos! é o que eu chamo reatar a tradi??o... E depois feito por você proprio, Ramires, que chic! Caramba, que chic! é um fidalgo, o maior fidalgo de Portugal, que, para mostrar a heroicidade da Patria, abre simplesmente, sem sahir do seu solar, os archivos da sua Casa, velha de mais de mil annos. é de rachar!... E você n?o precisa fazer um grosso romance... Nem um romance muito desenvolvido está na indole militante da Revista. Basta um conto, de vinte ou trinta paginas... Está claro, os Annaes por ora n?o podem pagar. Tambem, você n?o pre

ria Nunes, agitando o bra?o esguio d'Apostolo deante d'um sujeito obeso, de vasto collete branco, qu

arlamento e da Politica!... E o trabalho, a composi??o moral dos vetustos Ramires, a resurrei??o archeologica do viver Affonsino, as cem tiras de alma?o a atulhar de prosa forte-n?o o assustavam... N?o! porque felizmente já possuia a ?sua obra?-e cortada em bom panno, alinhavada com linha habil. Seu tio Duarte, irm?o de sua m?e (uma senhora de Guimar?es, da casa das Balsas), nos seus annos de ociosidade e imagina??o, de 1845 a 1850, entre a sua carta de Bacharel e o seu Alvará de Delegado, f?ra poeta-e publicára no Bardo, semanario de Guimar?es, um Poemeto em verso solto, o Castello de Santa Ireneia, que assignára c

da tarde, en

omno amar

vam ?o nosso Walter Scott?, comp?r um Romance moderno, d'um realismo épico, em dous robustos volumes, formando um estudo ricamente colorido da Mei

m saber destro, o tio Duarte. O Pa?o acastellado de Santa Ireneia, com as fundas carcovas, a torre albarran, a alca?ova, a masmorra, o pharol e o bals?o: o velho Tructesindo, enorme, e os seus flocos de cabellos e barbas ancestraes derramados sobre a loriga de malha; os servos mouriscos, de surr?es de couro, cavando os regueiros da

mourisca, entr

lgada

m que se saciam a punhal os rancores de ra?a, o heroico fallar despedido d

a! O solar d

edra a pedr

m bastardo

viltado, as

surrei??o do velho Portugal, t?o bella no Castello de Santa Ireneia, n?o era obra individual do tio Duarte-mas dos Herculanos, dos Rebellos, das Academias, da erudi??o esparsa. E, de resto, quem conhecia hoje esse Poemeto, e mesmo o Bardo, delgado semanario que perpassára, durante cinco mezes, ha cincoenta an

anco Hypothecario, ainda promettera acompanhar as primas Chellas a uma Exposi??o de Bordados na livraria Gomes. E annunciou ao Patri

lhe p

os bra?os, resguardados pelas mangas d'alpaca, at

s Ramires!... E tudo na mesma Torre! Na Torre o velho Tructesindo pratica o feito; e setecentos annos depois,

carta) todos os cartapacios que por lá encontrares com o titulo de ?Chronicas do Rei Fulano...? Depois, do pó das suas estantes, desenterrou as obras de Walter Scott, volumes desirmanados do Panorama, a Historia de Herculano, o Bobo, o Monge de Cistér. E assim abastecido, com uma farta rêsma de tiras d'alma?o sobre a ban

da tarde, en

omno amar

lor, luar e arvoredos, que lhe fornecia a aldeia-para levantar, logo á entrada da sua Novella, o ne

reu ao quarto, que fechou á chave, empurrando contra a porta a commoda com t?o desesperada anciedade que frascos de crystal, um cofre de tartaruga, até um crucifixo, tombaram e se partiram. Depois gritos e latidos findaram no pateo-mas Gon?alo n?o se arredou n'essa noite d'aquelle refugio bem defendido, fumando cigarros, ruminando um furor sentimental contra o Relho, a quem tanto perdoára, sempre t?o affavelmente tratára, e que apedrejava as vidra?as da Torre! Cêdo, de manh? convocou o Regedor; a Rosa, ainda tremula, mostrou no bra?o as marcas roxas dos dedos do Relho; e o homem, cujo arrendamento findava em Outubro, foi despedido da quinta com a mulher, a arca e o catre. Immediatamente appareceu um lavrador dos Bravaes, o José Casco, respeitado em toda a freguezia pela sua seriedade e for?a espantosa, propondo ao fidalgo arrendar a Torre. Gon?alo Mendes Ramires porém, já desde a morte do pae, decidira elevar a renda a novecentos e cincoenta mil réis:-e o Casco desceu as escadas, de cabe?a descahida. Voltou logo ao outro dia, repercorreu miudamente toda a quinta, esfarellou a terra entre os dedos, esquadrin

ernisasse, désse magestade senhorial ou bellesa saudosa áquelles macissos muros onde o luar, deslisando atravez das rexas, salpicava scentelhas pelas pontas das lan?as altas, e pela cimeira dos morri?es... E desde as quatro horas, no calor e silencio do domingo de Junho, labutava, empurrando a penna como lento arado em ch?o pedregoso, risc

desastrosamente emperrára. E fechando na gavêt

do! é este calor! E depois aquell

iamente a nuca, a derradei

... E os pallidos raios, os eternos pallidos raios!... Tambem este maldito castello, t?o

ia, batendo desesperadamente a porta, n'um tedio immenso da sua obra, d'aquelles confusos e enredados P

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